Pois bem, meu pai volta e meia fica de mal com o mundo. Apesar de um coração enorme, tem um temperamento daqueles. Na minha vida, segundo ele, eu sempre fiz malcriação desde que aprendi a falar. No meu dia a dia, ainda de acordo com o pensamento dele, eu tenho duas agendas: uma para meus compromissos diários e outra para colocar as 365 diferentes maneiras de humilhar e ofender meu pai no ano. Isso sem contar que desde minha adolescência que eu ouço a frase "não quero te ver nunca mais na minha frente", ou "a partir de hoje você está abandonada de pai", e por aí vai...
Pois bem, como ele estava nessa fase de não querer me ver nunca mais de novo, ele resolveu a ir se acostumar a viver só. (Ah sim, a minha mãe é minha cúmplice, logo, ela tá fora também). E como se faz isso??? Ah, móle: se operando escondido de todo mundo, ué?!!!
Ããããhhhh?!?!?!?!!?
Isso mesmo, no sábado a noite eu e minha mãe descobrimos, por terceiros, que meu pai estava operado em casa. Que???? Como assim operado??? Cara, fiquei uma fera e imediatamente (23h50), liguei pra ele e soltei os bichos. Perguntei se ele tinha enlouquecido de vez e se ele tinha alguma preferência de qual hospício ele preferia ser internado. Falei também que ele tinha sorte de estar a kilometros de distância porque senão eu arrancaria aqueles pontos um a um com os dentes.
Enfim, e qual a solução?? Sim, porque deixá-lo sozinho lá é o que ele merecia, mas e ele se comporta?? Fez comida, lavou a área do cachorro, faxinou a casa... Sério: não dava pra ele ficar lá uma semana sozinho. Definitivamente. Eu não podia subir no domingo de manhã porque tinha um compromisso a tarde. Minha mãe, que também não sabia de nada, marcou uma bateria de exames para serem feitos durante a semana. Então, usei a minha psicologia toda particular, que todos criticam mas que sempre dá certo, e fui busá-lo, mas sem avisar nada antes, claro. Afinal de contas, ele não queria me ver nunca mais, lembram?!
Pois bem, cheguei lá no domingo a noite, ele levou um baita susto, me mandou ir embora, falou um monte de gentilezas, aí eu fiquei acalmando a pecinha dizendo que tinha ído lá para cuidar dele, e que ele ficasse tranquilo porque eu não tinha conseguido comprar um revólver então que não iria matar ninguém naquele dia. Liguei para a Mamy's para avisar que eu já tinha chegado. Ela perguntou: "ele já sabe que você foi aí buscar ele?" Aí eu respondi: "ainda não!".
Fiquei lá conversando, falando, ouvindo e depois de ele me enrolar um tempão, finalmente foi dormir. E antes de ir deitar eu disse: "ah, além de vir cuidar de você, eu vim te buscar pro Rio. Descemos amanhã depois da consulta com o médico. E seria muito legal se você não dificultasse as coisas porque eu tô de TPM e você VAI de qualquer jeito".
P.s.: Antes de entrar em casa fui tomando cautelosas providências. Primeiro peguei logo a chave do carro pra não ter risco de ele me boicotar. Depois, quando ele se acalmou, fui perguntando sobre os remédios, os pontos e tudo mais para no caso de eu precisar pegar tudo escondido. Ok, voltando...
Pois bem, na manhã seguinte, fomos para a clínica. Ele fez umas pirraças, o médico atrasou um pouco mas, enfim, missão cumprida. Trouxe o meliante sem a necessidade de cordas ou algemas. Já aqui no Rio, meu deus, ôôhhh criança difícil. Não cumpre as orientações médicas, faz a compressa de água fria errada pra poder ver TV (que não poderia assistir), aaaaaaiiiii!!!!
Mas, tá decidido: se não aprenderem a se comportar, com 70 anos vai todo mundo pro asilo.
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